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16 de junho de 2015

A experiência dos limites na literatura

Radiografia de flores, Steven Meyers
Escritas em distintos séculos, movimentos artísticos diversos e diferentes cantos do mundo, Sofrimentos do Jovem Werther (Goethe, Alemanha, 1774),  Ligações Perigosas, (Choderlos de Laclos, França, 1782), Cartas Portuguesas, atribuídas a Mariana de Alcoforado (França, 1669), e Novas Cartas Portuguesas (Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, Portugal, 1973), são quatro obras que tudo teriam para ser distantes, caso algo não as aproximasse. 


Aproxima-as, então, a sua construção epistolar e a violência com que exploram o tema preferido da literatura: o amor. Se o amor é violento e rasga corações, cozendo-os com a agulha da dor, é também assunto em que pensar e  a partir do qual indagar a natureza humana.

Nas quatro obras é analisado este jogo sob a perspetiva dos dois jogadores (caso houvesse uma obra do século XXI, seriam mais os cenários do jogo): enquanto a obra de Goethe, fundadora do Romantismo, se debruça sobre um homem de coração desvendado por uma auto-análise minuciosa, e Laclos revela o sofrimento das vítimas do jogo, na sua dimensão mais perversa, as novas e velhas cartas portuguesas dão-nos a perspetiva da mulher, coisificada no jogo do amor e do sexo. 

Desta forma, as quatro obras respondem perfeitamente ao tema da experiência dos limites. 

 Beatriz Lourenço, 12º E, Clássicos da Literatura

7 de junho de 2015

Passe de calcanhar

Homens e mulheres andavam felizes e contentes pelos prados e viviam em paz, até que um dia tiveram frio. Desde então, começaram com a mania da propriedade e mudaram-se para as cavernas, onde os homens deixavam as mulheres a cuidar das crias enquanto iam caçar. Como os homens são seres naturalmente singelos, confundiram tudo e ganharam a outra mania que viria a desencaminhar a humanidade, a mania de que as mulheres são objectos de parir e de servir.

O mundo foi girando e, no século XX, três Marias emancipadas pegaram em si e na sua emancipação e escreveram um livro epistolar sobre o amor, desta vez sob a perspectiva feminina. Sentiram-se “menos desamparadas”, confessaram. Talvez por se subtraírem ao amparo do Estado Novo e experimentarem a liberdade de quem pensa. E assim, as Novas Cartas Portuguesas foram um escândalo e uma heresia, nomes que os ditadores chamam ao inconformismo e, muitas vezes, à plenitude artística.

Na obra, a mulher difere mais da casa do que o que é costume, ela pensa, ela fala, ela sente. Ela não é uma parideira, ela quer prazer sexual. Ela não é uma escrava, ela quer serviço mútuo. Ela não é frágil, ela é humana… e revela a humanidade do homem.

Mas depois de desvendar a fragilidade e o marialvismo masculino, ela ama-o, ela quere-o, ela deseja-o. A mulher, forte, encontra no homem a sua fraqueza, no amor o seu “calcanhar de Aquiles”. Vejamos o Aquiles a virar Ronaldinho e a dar toques no jogo do amor, porque a mulher não é uma casa ou uma consola, é uma jogadora, e uma jogadora à altura.

Beatriz Lourenço, 12º E, Clássicos da Literatura

13 de março de 2013

Novas Cartas Portuguesas #2


Novas Cartas Portuguesas é uma obra escrita conjuntamente pelas escritoras Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa. Publicada em 1972, inspira-se nas famosas Lettres Portugaises, uma obra clássica do século XVII, composta por cinco cartas em francês, supostamente escritas por uma freira portuguesa, Mariana Alcoforado, no Convento da Conceição, em Beja, após ter sido seduzida e abandonada pelo amante, o cavaleiro francês Noel Bouton (Chevalier de Chamilly).

NCP constitui um marco crucial na evolução do pensamento feminista na literatura portuguesa, revelando, através de uma escrita ousada e por vezes agressiva, a existência de situações discriminatórias agudas em Portugal, relacionadas com a repressão ditatorial, o poder do patriarcado católico e a condição da mulher, sobretudo no que se referia ao casamento, à maternidade e à sexualidade feminina. 

Quando o livro foi publicado, causou grande escândalo, por ter sido considerado “imoral” e “pornográfico”, uma vez que as autoras abordavam temas considerados tabu, como o desejo físico e o fingimento do prazer feminino enquanto forma de alimentar as ilusões masculinas. Para além de outras críticas à sociedade portuguesa de então. 

A primeira edição de NCP foi recolhida e destruída pela Pide, e as autoras, acusadas de atentado à moral pública, foram interrogadas na polícia política e enxovalhadas em público. Mas a sua obra ficou conhecida nos dois lados do Atlântico, bem como as autoras (desde logo apelidadas “as três Marias”) que se tornaram alvo da atenção da imprensa internacional, do New York Times ao Nouvel Observateur. Simone de Beauvoir, Stephen Spender, Marguerite Duras e Doris Lessing foram algumas das personalidades que deram o seu apoio às autoras e que protestaram com ênfase contra o seu julgamento. Mas só após o 25 de abril é que o processo foi suspenso. 

O livro é composto por vários fragmentos, o que expressa a própria conceção da mulher portuguesa, desgarrada na sua essência, mas transmite uma só mensagem: a mulher também tem voz.  E apesar de ter sido publicado em 1972, o livro denuncia situações que, ainda hoje, são uma realidade no nosso país: é o caso da violência doméstica. Receio que este tipo de violência se verifique na nossa sociedade ainda por muito tempo, devido à mentalidade machista que continua impregnada na nossa cultura. De facto, a mulher continua a ser vista por muitas pessoas como propriedade do homem.

Enquanto seres humanos e mulheres, devemos continuar a luta das “Três Marias”, no desmantelamento das mentalidades retrógradas e machistas que continuam a proliferar, não só em Portugal, como um pouco por todo o mundo. Está nas mãos das gerações vindouras evitar que os direitos que as mulheres ocidentais conquistaram tão duramente se deteriorem, e batalhar para que todas as mulheres, nos quatro cantos do mundo, possam ser vistas como seres humanos, dotadas de inteligência e de coragem, mas também de fragilidades, tal como os homens. 

Indira Leão, aluna de Clássicos da Literatura do 12º F

8 de março de 2013

Novas Cartas Portuguesas



Escritas por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, e publicadas em 1972, Novas Cartas Portuguesas são um esplêndido exemplo da luta pelos direitos das mulheres numa sociedade extremamente opressiva e conservadora, na qual o papel da mulher se limitava à lida doméstica e ao cuidado do marido e dos filhos. 

Maltratadas, enclausuradas, casadas à força, enganadas, exploradas e, apesar de tudo, extremamente pacientes” (Maria Graciete Besse), foram estas as mulheres que inspiraram as autoras a lutar pela mudança dos códigos morais e das mentalidades, a lutar contra o conformismo instalado em Portugal


Lutar, ser um pouco mais, ou mesmo sonhar, não era então permitido às mulheres, mas estas três uniram-se e desta união surgiu uma obra única que os movimentos feministas, sobretudo em França e nos Estados Unidos, acolheram com grande entusiasmo. Mas, no Portugal da ditadura, as "três Marias", como ficaram conhecidas, foram acusadas de “pornografia e ultraje à moral pública”, e viram a sua obra apreendida pela censura e retirada do mercado. O que não impediu a sua leitura e reconhecimento.

Este livro é um grito de liberdade, de frontalidade e de extrema coragem, pois nele são abordados temas tabu, desde os abusos sexuais, ao quotidiano da mulher portuguesa. “Que de homens precisamos, mas não destes”, escrevem as autoras. De facto, o comportamento masculino é duramente criticado, embora seja apoiado pela sociedade, e o homem é denunciado como o machista que maltrata, abusa e detém uma superioridade gigantesca sobre a mulher, a qual lhe deve submissão. 

As Novas Cartas são assim uma confissão de “perplexidade sobre o mundo” e o testemunho de uma luta constante que só será vencida com persistência e amor “nunca cansado”.  Toda a obra é uma prova de resistência, de coragem e de bravura, onde a verdade nunca é encoberta. 

Na última carta, a ponto de concluir esta obra a três mãos, dirá a voz comum das três mulheres: “Continuamos sós, mas menos desamparadas”.

Carolina Quitério, aluna de Clássicos da Literatura do 12º E